Finanças Sustentáveis, por Gustavo Pimentel

Este blog contém reflexões de um observador e ativista das Finanças Sustentáveis, além de organizar e arquivar todos os artigos/notícias de minha autoria ou que citem meu nome, publicados em jornais, revistas e websites sobre o tema.

Thursday, July 26, 2007

Cliente sob suspeita traz dilema a bancos

Publicação: Folha de São Paulo (22/07/2007)


Caso do HSBC, que financia usina autuada por supostas condições degradantes de trabalho, revela conflitos para preservar imagem
Instituições financeiras que se comprometem a seguir padrões socioambientais em empréstimos enfrentam desafios para evitar perdas
JULIO WIZIACK
DA REPORTAGEM LOCAL
Eleito pelo jornal "Financial Times" como um dos mais severos na concessão de crédito, o HSBC financia no Brasil a usina de álcool Pagrisa, autuada no início do mês pelo Ministério do Trabalho por ter mantido em sua fazenda, em Ulianópolis (PA), 1.108 funcionários em supostas condições de trabalho análogas à escravidão.O financiamento, feito há dois anos, seria quitado em 2010. Com o processo aberto pelo ministério -cuja conclusão está prevista para o início desta semana-, a Pagrisa pode entrar para a lista suja das companhias brasileiras, e isso arranharia a imagem do HSBC. A usina nega irregularidades.
Tecnicamente, não há nada de errado no financiamento do HSBC à Pagrisa -ocorrido antes da autuação do ministério. O rigor do banco na avaliação do risco de crédito chega a ser exagerado em alguns quesitos. Além disso, não há como prever que, após a concessão do crédito, as empresas infringirão uma cláusula do contrato.O problema é que, em momentos de crise, os bancos não costumam manter a transparência exigida das empresas que pedem recursos. "Eles gostam de placas dizendo que financiam obras monumentais e jogam histórias comprometedoras debaixo do tapete", diz Gustavo Pimentel, gerente do Projeto Eco-Finanças da ONG Amigos da Terra.
Por meio de sua assessoria, o HSBC alegou sigilo bancário para não se pronunciar sobre o caso. Mas o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) confirma que o HSBC usou o Finame no repasse de recursos à Pagrisa.O Finame é uma linha de crédito oferecida pelo BNDES para a compra de máquinas e equipamentos a juros mais baixos que os de mercado. Os contratos são firmados entre o BNDES e os bancos comerciais da praça, que transferem o dinheiro às empresas- geralmente em parcelas- cobrando uma taxa pelo serviço.
Riscos
Na transação com a Pagrisa, o HSBC assumiu todos os riscos. Aí começa a confusão. Na semana passada, a usina teve seus contratos de venda de álcool cancelados por BR Distribuidora, Esso e Texaco.Signatárias do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, essas companhias deixaram de comprar por mês 5 milhões de litros de álcool."Sem essa receita, corremos o risco de fechar", afirma Marcos Zancaner, um dos proprietários da usina.As chances de a Pagrisa não pagar o financiamento são grandes.
Caso o processo aberto pelo Ministério do Trabalho termine em condenação, o BNDES deverá ordenar ao HSBC a suspensão das parcelas restantes do financiamento.Segundo a Pagrisa, os recursos foram liberados de uma só vez, e isso levaria o HSBC a "devolver" os recursos ao BNDES sob o risco de responder junto com a empresa por possíveis irregularidades.É o que prevêem os Princípios do Equador, um conjunto de normas definidas pelo Banco Mundial que regulam a concessão de créditos.Pelas normas, não pode haver dinheiro para quem destrói o ambiente ou mantém funcionários em condições degradantes de trabalho. Em caso de irregularidades comprovadas após a liberação dos recursos, o crédito tem de ser cortado para evitar a co-responsabilização.
O desafio para os bancos é a superação dos conflitos de interesse. Muitas vezes os sócios ou acionistas majoritários das empresas que batem às portas dos bancos pedindo empréstimos têm, em geral, conta corrente e de investimento abertas na instituição que concede o crédito.
A Pagrisa agora tenta provar sua inocência ao Ministério do Trabalho e evitar o pior. Cedendo ao apelo da bancada do Pará no Congresso, o ministro Carlos Luppi recebeu o dono da usina na semana passada.Mesmo que a empresa seja condenada, poderá ainda evitar sua inclusão no cadastro nacional das empresas que contratam mão-de-obra análoga à escrava por meio de liminar, procedimento adotado por 30 companhias brasileiras.
HSBC diz que segue norma internacional
DA REPORTAGEM LOCAL
Por meio de nota, o HSBC afirmou que segue o compromisso com as normas para coibir a liberação de financiamento a empresas com práticas socioambientais não-sustentáveis. Disse, no entanto, que não poderia comentar o caso da Pagrisa."O HSBC informa que, por força do sigilo bancário, não pode comentar nomes de clientes ativos ou potenciais. Informa ainda que aderiu ao Protocolo pela Erradicação do Trabalho Escravo e que, entre os principais critérios de análise e concessão de crédito, faz consultas à lista do Ministério do Trabalho de empresas citadas por trabalho escravo", diz.

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